A história para chegar aos Juros sobre Capital Próprio começou no ano-base 1978 exercício de 1979 com o início da aplicação no disposto no Decreto-Lei de nº 1.598/1978 que adaptou a legislação do IRPJ às normas contidas na Lei de nº 6.404/1976.
Foram modernizadas as demonstrações financeiras e introduzida a Correção Monetária das contas da contabilidade dos contribuintes visando minimizar os efeitos da inflação – que era estratosférica – sobre o patrimônio das empresas.
Isto porque a contabilidade sempre utilizou do princípio de REGISTRO HISTÓRICO dos fatos administrativos das empresas e pelo CUSTO HISTÓRICO gerando a distorção que o sistema de correção monetária visava expurgar.
Ex: Se colocar R$100.000,00 no cofre de uma empresa e ficar lá inerte até 31 de dezembro, temos um registro verdadeiro no balanço, ou seja, VALE O QUE ESTÁ ESCRITO. Porém, o poder de compra daquela quantia em 31/12 não será o mesmo porque sofreu os efeitos da inflação do ano.
Já ao contrário, um terreno comprado em 02 de janeiro por R$1.000.000,00, registrado na contabilidade em 31/12 constará pelo mesmo valor, porém seu preço será bem diferente, ou seja, aquele bem está protegido pelos efeitos da inflação. O valor de R$1.000.000,00 no balanço de 31/12 daquele ano não reflete o valor de mercado.
Era esse o princípio para que fizesse anualmente a chamada correção monetária dos balanços.
Veio o Plano Real em 1994 e extinguiu a inflação estratosférica sem, porém, extirpá-la. O exemplo é o Dólar que era 1 x 1 em relação ao Real e estamos em torno dos R$5,50 reais por 1 dólar atualmente.
Veio a SELIC em janeiro de 1995 e até setembro está com 3.178,2% por cento desde sua criação. Ainda estamos com inflação por mais que se dizem estar controlada.
Visando minimizar os efeitos da inflação, a partir de 01/01/1995 – sem a correção monetária dos balanços – foram criados os JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO, dedutível na apuração do LUCRO REAL do IRPJ pela LEI Nº 9.249 DE 26 DE DEZEMBRO DE 1995, que em seu artigo 9º dispôs:
Art. 9º A pessoa jurídica poderá deduzir para efeitos da apuração do lucro real os juros pagos ou creditados individualmente a titular, sócios ou acionistas a título de remuneração do capital próprio calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação pro rata dia da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP. (gr.n)
§ 1º O efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros computados antes da dedução dos juros ou de lucros acumulados e reservas de lucros em montante igual ou superior ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados. (Redação dada pela Lei nº 9.430 de 1996) (Produção de efeito)
§ 2º Os juros ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de dezoito por cento na data do pagamento ou crédito ao beneficiário. (Redação dada pela Medida Provisória nº 694 de 2015) (Produção de efeitos) (Vigência encerrada)
§ 3º O imposto retido na fonte será considerado:
I – antecipação do devido na declaração de rendimentos no caso de beneficiário pessoa jurídica tributada com base no lucro real;
II – tributação definitiva no caso de beneficiário pessoa física ou pessoa jurídica não tributada com base no lucro real, inclusive isenta, ressalvado o disposto no § 4º;
Desnecessário comentar pormenores de como é o sistema para apuração dos JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO para não reinventarmos a roda, uma vez que empresas de consultoria como a COAD, por exemplo, e outras similares já publicaram excelentes orientações sobre o tema, abordando toda fundamentação legal, inclusive com exemplos práticos.
Ao concluir que o sistema de Juros Sobre o Capital Próprio, apesar de uma das formas de incentivar investimentos pelos empresários, não resolveu o problema da atualização dos valores dos ativos fixos das empresas, foi então criado pela Lei 12.973/2014 – Art. 24 A e B a AVALIAÇÃO PELO VALOR JUSTO, também bem comentado pela COAD, criando mecanismo para que nos balanços das empresas os valores estejam de acordo com os preços de mercado na data das respectivas demonstrações financeiras.
A mesma Lei 12.973/2014 determinou o AJUSTE A VALOR PRESENTE em função da padronização das normas contábeis brasileiras às normas internacionais. Deverão ser ajustados a valor presente os elementos do Ativo decorrentes de operações de longo prazo, bem como as obrigações, os encargos e os riscos classificados no Passivo não Circulante, sendo os demais ajustados quando houver efeito relevante. Nesse critério contábil, receitas ou despesas apropriadas anteriormente em outras rubricas são registradas como receitas ou despesas financeiras, ocasionando o reconhecimento em período diferente daquele determinado pelo critério contábil anterior.
Desse modo, os procedimentos fiscais a serem observados para neutralizar esse efeito na determinação das bases de cálculo de tributos federais têm que observar o que determina a Lei 12.973/2014. Também não vamos entrar em detalhes, pois existem publicações, como já citado, que esclareceram todo o sistema.
Portanto, os Juros sobre o Capital Próprio como DESPESAS DEDUTÍVEIS na apuração do Lucro Real para fins de IRPJ e CSSL continua sendo um incentivo aos empreendedores.
Porém, quando tudo está funcionando bem, vem o Governo Federal tentando piorar, alterando pela Lei nº 14.789/2023 a partir de 01/01/2024 o seguinte:
Uma alteração importante diz respeito à exclusão da base de cálculo para a determinação do JCP das ações em tesouraria que estava permitida desde 1º de janeiro de 2015.
As reservas de capital e reservas de lucro também sofreram reduções da base de cálculo. Agora, apenas as seguintes reservas de capital poderão ser utilizadas para fins do cálculo do JCP: (a) o valor da contribuição do subscritor que ultrapassar o valor nominal das ações e (b) parte do preço de emissão de ações que for definido como destinado à formação de reservas de capital.
Em relação às reservas de lucros, a nova lei excluiu da conta o valor das doações ou subvenções governamentais para investimentos.
Todas estas alterações implicam na redução do valor da base de cálculo para a determinação do JCP, o que diminui o valor dedutível do IRPJ e da CSLL a partir de 01.01.2024.
É importante vermos como o CARF e a Justiça têm decidido sobre o tema:
1) No CARF, as seguintes decisões corroboram o tema:
a) Número do processo: 16327.000891/2008-17
Data da sessão: Wed Dec 05 00:00:00 UTC 2012
Data da publicação: Tue Apr 02 00:00:00 UTC 2013
Ementa:
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ Exercício: 2006
Ementa:
DESPESAS OPERACIONAIS. JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO. DEDUTIBILIDADE.
A remuneração ou não do capital próprio constitui uma faculdade ínsita à esfera de decisão da pessoa jurídica, sendo-lhe lícito, ao decidir pela remuneração, apropriar a despesa no momento que melhor lhe aprouver. Contudo, os efeitos fiscais decorrentes de tal decisão são ditados pela norma tributária de regência. Nos termos do art. 9º da Lei nº. 9.249/95, a observância dos critérios e limites para fins de dedutibilidade deve ser feita no momento em que a despesa com os juros é apropriada no resultado.
(…)
Número da decisão: 1301-001.118
b) Número do processo: 11020.003017/2004-39
Turma: Primeira Turma Ordinária da Terceira Câmara da Primeira Seção
Data da publicação: Thu Jan 27 00:00:00 UTC 2011
Ementa:
ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ Exercício: 2004 IRPJ. CSLL. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. NATUREZA JURÍDICA. DESPESAS FINANCEIRAS.
Os juros sobre o capital próprios pagos ou creditados a titular, sócio ou acionista têm natureza jurídica de despesa financeira e não de lucros nem de dividendos.
IRPJ. CSLL. JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO. CRÉDITO OU PAGAMENTO EM VALOR NÃO PROPORCIONAL À PARTICIPAÇÃO DO SÓCIO NO CAPITAL SOCIAL. INDEDUTIBILIDADE.
Sendo os juros sobre o capital próprio remuneração do capital aplicado pelo titular, sócios ou acionistas na pessoa jurídica, o crédito ou pagamento individualizado para cada um deve ser proporcional a sua participação no capital social da pessoa jurídica. A parcela excedente não configura remuneração a esse título e, portanto, não pode se beneficiar da dedutibilidade conferida aos juros sobre o capital.
Número da decisão: 1301-000.480
2) E do Colendo STJ colecionamos decisão interessante sobre utilização dos Juros sobre o Capital Próprio deduzindo os limites dos exercícios anteriores verbis:
STJ – AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL: AgInt no REsp 1939282 CE 2021/0153949-4
Jurisprudência Acórdão publicado em 24/03/2023
Ementa
TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E CSLL. JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO. DEDUÇÃO. LIMITES. EXERCÍCIOS ANTERIORES. REGIME DE COMPETÊNCIA. POSSIBILIDADE.
1. A distribuição de juros sobre capital próprio pode ser realizada em exercício posterior ao da apuração do lucro, com a dedução da respectiva despesa na apuração do IRPJ/CSLL.
2. O pagamento de juros sobre capital próprio não é sujeito a periodicidade alguma (tanto menos coincidente com exercícios tributários) e configura faculdade da empresa, inexistindo obrigatoriedade de distribuição (diferentemente do regramento dos dividendos, por exemplo). Para apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), se o contribuinte for tributado pelo regime do lucro real, os juros sobre capital próprio devem ser registrados contabilmente como receita financeira, não possuindo natureza de lucro ou de dividendo.
3. O pagamento de juros sobre capital próprio referente a exercícios anteriores não representa burla ao limite legal de dedução do exercício, desde que ao serem apurados tomando por base as contas do patrimônio líquido daqueles períodos, com base na variação pro rata die da TJLP sobre o patrimônio líquido de cada ano, o pagamento seja limitado ao valor correspondente a 50% do lucro líquido em que se dá o pagamento ou a 50% dos lucros acumulados e reservas de lucros”.
Concluindo, a motivação para a criação dos Juros sobre o Capital Próprio discorrida no início deste texto continua, e devemos lutar por sua preservação, pois incentivando investimentos nas empresas produtivas é certeza de geração de postos de trabalho com carteiras assinadas!
Pablo Juan Estevam Morais
Advogado Tributarista
Roberto Rodrigues de Morais
Consultor Tributário
Fonte: Pablo Juan Estevam Morais e Roberto Rodrigues de Morais